
De onde vem a meditação?
Ninguém sabe exatamente como a meditação começou. Imagina-se que terá sido há uns 5.000 anos, quando os feiticeiros tribais – os xamãs – reuniam a tribo à sua volta e invocavam os espíritos naturais. Ou talvez tenham sido alguns homens que olharam para o crepitar do fogo e se sentiram atraídos visualmente pela dança das chamas. Aos poucos, foram surgindo exercícios mais ou menos ritualizados, que auto-induziam estados alterados de consciência e que, mais tarde, foram codificados. Os primeiros registos escritos sobre meditação apareceram em textos místicos do sub-continente indiano, os Vedas (a base do hinduísmo, redigido em sânscrito védico), por volta do ano 1.500 antes de Cristo. Mestres taoístas chineses, como Lao-Tzu e Chuang-Tzu, sistematizaram exercícios meditativos no século quinto a.C. Siddhartha Gautama – o Buda – nasceu por volta do 565 a.C. em Lumbini, no atual Nepal, e introduziu a meditação como uma prática corrente entre os seus seguidores, com o objetivo de superar as distrações do mundo e para os ajudar a entender a verdadeira natureza das coisas. Buda criou uma prática meditativa denominada Vipassana, que presta atenção plena à respiração (anapanasati) ou às sensações do corpo, não julgando os pensamentos que surgem. Jesus Cristo nunca referiu explicitamente a meditação nas suas pregações, mas aconselhava os seus discípulos: “mas tu, quando orares, entra no teu quarto e, fechando a tua porta, ora a teu Pai e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará publicamente” (Mateus 6:6).
Entre os anos 400 a.C e 200 da nossa era foi escrito o Bhagavad Gita, um compêndio espiritual sobre a filosofia do yoga e da meditação, que estabeleceu os preceitos da devoção ao deus hindu Krishna. No ano de 653 depois de Cristo, abriu no Japão o primeiro espaço dedicado exclusivamente à meditação. A partir do século XII, desenvolveu-se neste país o zazen (literalmente meditação sentada), onde o praticante se senta em posição de lótus sobre uma pequena almofada redonda (o zafu). Depois de unir as mãos debaixo do umbigo, deve fixar o olhar semicerrado sobre o centro da sala ou a parede e fazer contagens até dez dos ciclos de inspiração e expiração, ao mesmo tempo que se fixa a atenção mental no “agora”, evitando os pensamentos e preocupações. Os monges zen meditam quotidianamente quatro a seis períodos de 30 a 40 minutos, enquanto os leigos o fazem apenas durante cincos minutos diários: mais do que tudo, importa a constância da prática.
Os primeiros eremitas e monges cristãos, que viviam em reclusão em grutas e mosteiros no Egipto e na Síria, foram recebendo estas influências orientais e replicaram os terços budistas e a prática contemplativa de imagens religiosas. No século XVI, a freira carmelita santa Teresa de Ávila (ou de Jesus) renovou o misticismo católico, propondo uma novo modo de rezar que inclua o esvaziamento do espírito, o calar da imaginação e finalmente o amar a Deus. Atualmente, um grupo cada vez maior de católicos medita utilizando como mantra a palavra maranata, que significa em aramaico “Senhor vem” e se encontra na primeira carta de São Paulo à igreja de Coríntio. Os místicos islâmicos, os sufis, meditam dançando em rodopio e de acordo com movimentos sagrados que os aproximam de Deus. A partir do século XIX, a tradução de numerosos clássicos orientais para as línguas europeias reforçou o interesse dos ocidentais pela meditação. Em 1922, Hermann Hesse publicou o seu famoso livro “Siddhartha”, o relato da viagem de auto-descoberta espiritual de Buda. Na década de 1950, a meditação Vipassana renasceu a partir dos ensinamento de S.N. Goenka, um hindu nascido em Myanmar (antiga Burma), que concebeu cursos intensivos de 10 dias. Em 1979, o médico norte-americano Jon Kibat-Zinn fundou o movimento mindfulness (atenção plena), fundindo o budismo zen com a medicina moderna, ainda que num contexto não religioso. A ideia é estar consciente do que se passa à nossa volta, tomando nota das nossas próprias emoções e do que sentimos no nosso corpo, aceitando tudo isto como parte integrante da experiência de ser humano.
A meditação é, nos começos deste século XXI, uma prática comum a homens e mulheres de todos os credos, raças e nacionalidades. Enquadrada por diferentes tradições religiosas ou filosóficas, aponta sempre no mesmo sentido original: o encontro do ser humano consigo próprio, no espaço do seu silêncio interior e à descoberta daquilo que ele verdadeiramente é, fora das exigências e das distrações daquele que parece ser o nosso mundo real e quotidiano. Dentro de cada um de nós existe um oceano imenso, uma verdade pessoal intrínseca, que só a prática regular e empenhada da meditação permite revelar. Meditar não é assim uma coisa apenas para iluminados ou esotéricos: é sentar e reaprender a escutar o nosso silêncio interior. A missão da Reflower é simplificar, desmistificar e levar a meditação a todos. Aceitar que a nossa existência começa, naturalmente, dentro de nós.

Lisboa, outubro de 2017